Rede separadora de esgoto e conexão às casas por conta da iniciativa privada

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Texto por
Silvia Noronha
Data
22 de dezembro de 2016

Em vez de privatizar, o caminho defendido pelo Governo do Estado para a Cedae é estabelecer subdelegações da companhia junto à iniciativa privada em 11 municípios da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ). A proposta de parcerias público-privadas (PPPs) em saneamento prevê investimentos em rede separadora de esgoto (não mais ‘tempo seco’) e na conexão da tubulação até dentro das residências, de modo a garantir uma cobertura efetiva de 80% em 15 anos. Com pagamento de contrapartida, os contratos teriam validade de 30 anos e depois disso os serviços poderiam voltar integralmente para a Cedae.

 

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A modelagem divide os municípios em três lotes com licitações independentes. A divisão de tarefas ficaria assim: a Cedae mantém o abastecimento de água, desde a captação, tratamento até a distribuição final ao cidadão. À iniciativa privada, por sua vez, caberia a coleta e o tratamento do esgoto, a gestão comercial da tarifa única e também a redução das perdas de água tratada. Hoje este índice ultrapassa os 30%, já tendo chegado a 50%, tornando a companhia estadual uma das piores do país.

O desenho definido pela Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico, Energia, Indústria e Serviço (Sedeis), em conjunto com a Estruturadora Brasileira de Projetos (EBP) e a Cedae, parte do princípio de que a companhia é a detentora dos contratos de longo prazo referentes aos serviços de água e esgoto assinados com as prefeituras.

Ou seja, não se trata de privatização, como defendia o BNDES; muito pelo contrário. “Nosso objetivo é promover o atendimento imediato à população, agregando valor à Cedae”, explica o titular da Sedeis, Marco Capute. Como a companhia já está investindo na melhoria do abastecimento de água, com o projeto Novo Guandu, faltava encontrar uma maneira de ampliar o vergonhoso quadro referente ao sistema de esgoto.

Leia também: A Cedae do futuro – Conheça as propostas da sociedade civil e do Governo do Estado 

A posição do Estado também pode ser medida em valores: a venda da empresa geraria entre R$ 1 bilhão e R$ 1,5 bilhão em receita para os cofres públicos, ao passo que, se tudo sair como previsto com as PPPs, o faturamento da Cedae terá um acréscimo de R$ 6,8 bilhões em 30 anos, considerando valores atuais. Em 2015, o faturamento da empresa atingiu R$ 4,47 bilhões (veja aqui o balanço).

Esse acréscimo estimado já desconta os R$ 3,6 bilhões (32%), também em valores atuais, que a companhia repassará como contraprestação às três novas concessionárias, caso a modelagem seja efetivada. Daí ser uma PPP e não uma concessão simples. A primeira modalidade de contrato prevê contrapartida do governo, enquanto a segunda garante o retorno do investidor somente com a cobrança de tarifa do consumidor.

A subsecretária de Parcerias Público-Privadas da Sedeis, Paula Martins, explica que a contraprestação é necessária para garantir todas as obras e serviços, que exigirão a aplicação total de R$ 6,9 bilhões, permitindo uma taxa de retorno ao investidor (TIR) de 9%. A Sedeis se apoia ainda em dois pontos: a companhia estadual será beneficiada pela redução das perdas, por meio de consertos de vazamentos nas ruas; e pela gestão comercial, com a potencial redução da inadimplência atual de 50% para 10%, em 12 anos.

“Isso vai contribuir muito para aumentar a receita da Cedae. Então uma parte desse incremento de receita da Cedae é que vai virar contraprestação, condicionada ao atingimento de metas de gestão comercial, incluindo inadimplência e redução de perdas. Como o setor privado cobra melhor do que o público, automaticamente vai diminuir a inadimplência. Se ele não reduzir a inadimplência, ele perderá um pouco na tarifa e um pouco na contraprestação. Não há hipótese de a contraprestação aumentar”, afirma Paula.

Riscos à vista: PSAM e tarifa social

Um ponto de atenção recai sobre os dois lotes de PPP onde há obras do Programa de Saneamento dos Municípios do Entorno da Baía de Guanabara (PSAM). A crise do Governo do Estado fez com que a Justiça arrestasse recursos previstos para São Gonçalo, cujas obras estão em andamento e já em atraso. O PSAM ainda está para iniciar as melhorias no sistema de esgoto em Duque de Caxias, em 2017. Uma eventual paralisação dessas intervenções representaria um risco para as PPPs das áreas 2 e 3 (ver mapa acima), pois a proposta prevê a operação desses equipamentos pela iniciativa privada.

Outro ponto de atenção gira em torno da tarifa social. A aplicação da tarifa social no modelo das PPPs estará limitada a 10% da população, quando a própria Cedae trabalha hoje com 30% na RMRJ. A Sedeis esclarece que a modalidade será respeitada conforme estabelecido em decreto estadual.

A minuta dos contratos, ainda não divulgada, deverá trazer os critérios de enquadramento, já que o decreto em questão fala apenas em aplicação dessa modalidade de pagamento para moradores de áreas de interesse social, sem estabelecer quais seriam. A Cedae alega ter procedimento interno para esses casos, mas as regras não são claras.

Punição pelo não cumprimento de metas

A receita das concessionárias e o pagamento das contraprestações estarão condicionados ao atingimento de metas de performance que abrangem expansão da coleta e tratamento do esgoto e da conexão domiciliar; redução progressiva de perdas d’água e da inadimplência; e indicadores de qualidade e de satisfação do usuário. (veja quadro abaixo).

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A modelagem considera a adoção da mesma tarifa aplicada hoje nesses municípios, corrigida anualmente pelo INPC. Entretanto, não atingir o desempenho esperado pode representar uma redução de receita de até 30%. A regulação ficará a cargo da Agenersa, contando ainda com um verificador independente para atestar o cumprimento de cada meta.

Que fim levou a ideia do ‘tempo seco’?

O Governo do Estado desistiu da coleta de esgoto em tempo seco. A Constituição do Estado do Rio não permite, observa Paula. O artigo 227, em seu parágrafo 1º, diz que “fica vedada a implantação de sistemas de coleta conjunta de águas pluviais e esgotos domésticos ou industriais”. Paula diz que há incoerências, que seria possível fazer o sistema único, mas não a cobrança de tarifa de esgoto da população. Apesar disso, a subsecretária lembra que a Justiça permitiu essa cobrança na Região dos Lagos.

Ela acrescenta que os estudos mostraram que o sistema em tempo seco, a ser implantado conforme determina as regras de licenciamento ambiental, seria mais caro do que o imaginado, sem trazer benefícios à altura para a população e para o corpo hídrico.

A obrigatoriedade de conexão às residências foi outro ponto incluído num segundo momento do estudo. “Pela nossa observação na AP 5 (Zona Oeste), a rede passa e os consumidores não se conectam. No nosso projeto isso é uma obrigação do concessionário, então efetivamente o esgoto será captado e levado para a estação de tratamento. Vai causar um benefício substancial para a saúde pública”, afirma.

Perfil das PPPs em saneamento

Três áreas:

Lote 1 – Nova Iguaçu, Japeri, Queimados, Seropédica e Itaguaí.

Lote 2 – Duque de Caxias, Belford Roxo, Mesquita e Nilópolis.

Lote 3 – São Gonçalo e Magé

População atingida: 4,3 milhões de habitantes

Divisão de tarefas:

Concessionário privado – Coleta e tratamento do esgoto, conexão da rede até as residências, gestão comercial da conta única de água e esgoto, redução das perdas de água, com conserto de vazamento, entre outras medidas.

Cedae – Captação, tratamento e distribuição de água.

Regulação e fiscalização – Agenersa + Verificador independente.

Modelo: subdelegações da Cedae (em vez de privatização) com contraprestação da companhia ao operador privado e bens reversíveis ao final do contrato.

Critério de julgamento: menor valor da contraprestação, de acordo com o maior percentual de desconto sobre o valor da mesma.

Prazo: 30 anos, prorrogáveis em caso de (1) atraso no início da gestão comercial e (2) de readequação do equilíbrio econômico-financeiro.

Meta: 80% de cobertura em 15 anos, prevendo instalação de rede separadora de esgoto e conexão da tubulação até as residências.

Retorno: elevação do índice de tratamento de esgoto do Estado do Rio de 10% para 53%.

Investimento: R$ 6,9 bilhões.

Indicadores: cumprimento de metas de desempenho operacional e desempenho comercial.

Obrigação da Cedae: garantia de fornecimento, com exceção dos grandes usuários, de volume total médio micromedido de água igual ou superior a 150 litros/habitantes/dia (ONU recomenda 110 l/hab/dia).

Tarifa: 50% do valor referente à água e 50% ao sistema de esgoto, com reajuste anual pelo INPC.

Tarifa social: critérios de aplicação ainda não estabelecidos.

Leia também: Prefeituras apontam desafios das PPPs em saneamento

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