Circuito Metropolitano: mostrar a história que a história não conta

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Texto por
Luize Sampaio
Data
5 de dezembro de 2023

Da vontade de levar para mais cantos da metrópole a história que pouco foi contada sobre o Rio e de democratizar o acesso à cultura, a Casa Fluminense realizou o Circuito Metropolitano do filme “Rio, Negro”. O documentário, produzido pela Quiprocó Filmes e apresentado pela Casa Fluminense, mostra os processos de formação sociais, políticas e culturais da cidade do Rio de Janeiro a partir da presença e influência de pessoas negras de origem africana.

Pensar a história da formação do Rio de Janeiro, sem considerar o impacto da população negra para essa construção, é apagar toda a contribuição social, política e cultural que forjou essa cidade, além de invisibilizar um passado de luta e resistência, que produz frutos até hoje. Reivindicar a memória que temos sobre a história da cidade é um dos caminhos possíveis para podermos compreender como se estruturou esse território.

O Circuito surgiu a partir da necessidade de democratizar o acesso às histórias que resgatam a narrativa construída sobre a cidade do Rio de Janeiro. Larissa Amorim, Coordenadora Executiva da Casa, falou sobre a importância do filme circular pela metrópole através do Circuito. “Ao percorrer diferentes territórios, estamos não apenas transmitindo um filme, mas promovendo um resgate de narrativas esquecidas e, acima de tudo, reafirmando a importância das vozes negras na construção da identidade do Rio de Janeiro. É uma oportunidade de reconhecimento, celebração e de dar luz às histórias que moldaram a cidade e a metrópole”, compartilhou.

Por onde o circuito percorreu

Ao longo de 6 meses, o Circuito circulou em cinco territórios diferentes. A primeira edição aconteceu em Queimados, durante o Fórum Rio, com a presença de 86 pessoas. Após a sessão, tivemos o debate “João Cândido, almirante negro baixadense”, que foi mediado por Larissa Amorim, coordenadora executiva da Casa Fluminense, e teve participação de Átila Bee, fundador da Cia Karma Círculus Teatro.

Na segunda parada, no Galpão Bela Maré, localizado no Complexo da Maré, o circuito recebeu 24 pessoas. A transmissão também contou com uma roda de conversa sobre a “Síndrome da Memória Curta e a Lei 10.639 na educação”, que falou sobre os desafios enfrentados na implementação dessa lei no ensino de história e cultura. Com mais uma mediação de Larissa Amorim, desta vez tivemos a participação de Álvaro Nascimento, pesquisador e professor titular de História do Brasil, e Luan Ribeiro, da Gerência de Relações Étnico-Raciais da Secretaria Municipal de Educação do Rio.

O circuito também marcou presença na zona oeste do Rio, com uma exibição no Espaço Cultural Arlindo Cruz, em Realengo, que contou com 103 pessoas assistindo o filme e debatendo sobre a “Importância do acervo oral e de imagens para garantia da memória das escolas de samba”. A roda de conversa abordou sobre os legados e construção de memória da história do samba, a partir dos acervos orais e de imagens. O debate teve a participação de Eryck Quirino, músico e percussionista; Laís Dantas, diretora de fotografia do filme; Tiãozinho, conselheiro e diretor cultural da GRES Mocidade Independente de Padre Miguel; e mediação de Vitor Mihessen, coordenador geral da Casa Fluminense.

No leste, o filme foi transmitido em São Gonçalo, no auditório da FFP-UERJ, onde 47 pessoas estavam presentes. Nessa transmissão também rolou o debate “O projeto de não ter projeto”, com uma troca sobre o planejamento urbano racista e excludente que estruturou a cidade do Rio no pós-abolição. Essa papo contou com a participação de Henrique Silveira, geógrafo e coordenador do Instituto Pereira Passos; Thais Matos, professora de Geografia e coordenadora de pesquisa do coletivo Ressuscita SG; Phellipe Patrizi, educador, especialista em Ensino de Histórias e Culturas Africanas e Afro-brasileiras, Doutorando em História Social pela UERJ-FFP; e mediação da Paola Lima, assessora de mobilização da Casa Fluminense.

A última parada do Circuito aconteceu no RenaCine, do Renascença Clube, em Andaraí, que teve 147 pessoas presentes que, nessa exibição, debateram sobre a “Herança Negra na Cultura”. Para o fechamento, tivemos a participação de João Batista e Nanci Rosa, coordenadores do projeto RenaCine; João Martins, Vice-presidente Cultural e Artístico do Renascença Clube; Desiree Reis, Mestra em História e Doutoranda em Museologia e Patrimônio; e Wania Sant’Anna, historiadora e produtora associada do filme “Rio, Negro”, mediando a troca.

No total, o circuito alcançou mais de 400 pessoas de diferentes regiões da metrópole. Taty Maria, Coordenadora de Operações da Casa e uma das produtoras do Circuito, comentou sobre a importância de promover o acesso gratuito e acessível à cultura no RMRJ.

“No ano em que ainda aguardamos a aprovação pelo senado da renovação da cota de telas para filmes brasileiros em salas de cinema, e que tivemos uma alta no preço médio do ingresso (R$19,74) em relação à 2019 (R$15,93), realizar o  Circuito Metropolitano do Filme “Rio, Negro” é contribuir para o acesso à cultura principalmente da população de baixa renda, e para a valorização do cinema brasileiro.”

Trajetória do “Rio, Negro”

O filme “Rio, Negro” estreou em 2 de março de 2023, com roteiro e direção de Fernando Sousa e Gabriel Barbosa, que construíram a narrativa do filme a partir da participação de grandes personalidades e intelectuais cariocas, como a vereadora Tainá de Paula, o ritmista Eryck Quirino, a ialorixá Mãe Meninazinha de Oxum, a historiadora Ynaê Lopes, entre outros nomes. Além das sessões gratuitas realizadas através do circuito, o filme circulou pelo Brasil em cidades como São Paulo, Palmas, Balneário Camboriú e Porto Alegre.

Para os roteiristas, Fernando Sousa e Gabriel Barbosa, é muito importante ver a repercussão que o documentário teve este ano. Eles compartilharam que, “o filme percorreu importantes festivais e eventos acadêmicos, no Brasil e no exterior. Com a sua inserção na programação do Canal Curta, esperamos que tenha um alcance ainda maior.”

Além disso, Fernando Sousa e Gabriel Barbosa, diretores e roteiristas do filme, também comentaram sobre a importância do Circuito para a trajetória do “Rio, Negro”. “O circuito metropolitano com o filme “Rio, Negro” enriqueceu a trajetória da obra, possibilitando a sua circulação em diferentes regiões da cidade e da região metropolitana do Rio de Janeiro. É uma iniciativa que contribui com um maior alcance do filme e que, ao mesmo tempo, também é fundamental para a formação de público”, ressaltam.

O futuro dessa história

Para além de resgatar e reivindicar a memória que temos sobre a história do Rio, o Circuito Metropolitano do filme “Rio Negro” veio para provocar um olhar para o futuro, que pensa a história da cidade de maneira diferente, e que conta ela considerando principalmente as vozes de quem plantou e construiu esse chão: a população negra e indígena.

A falta de acesso e incentivo à cultura é uma das consequências das desigualdades presentes nos territórios do Rio. Segundo o Mapa da Desigualdade 2023, dos 22 municípios da Região Metropolitana, 10 não possuem Conselho, Plano e Fundos Municipais de Cultura, conhecido como CPF da Cultura. Mais do que democratizar as salas de cinema, é preciso provocar o poder público para cumprir o seu papel e dever. O acesso à cultura e conhecer a história da nossa cidade é direito de todos.

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