A região metropolitana do Rio de Janeiro é um território composto em sua maioria por mulheres negras, em que brancos têm um salário melhor e a população que mais depende do transporte público para se locomover pode ter que comprometer até ⅓ da sua renda com a passagem. Essas disparidades são marcantes e traçam um pouco do perfil fluminense encontrado no Mapa da Desigualdade 2020, que foi lançado nesta quarta-feira (15/07) nas redes da Casa Fluminense.
Foram mais de 2.500 pessoas participando virtualmente do evento que contou com a presença do time de produção do Mapa e parceiros que somaram nesse projeto. Entre eles, os representantes das agendas locais 2030 de Queimados, Japeri, Maré, São Gonçalo e Santa Cruz que cederam as suas redes e retransmitiram ao vivo o evento de lançamento.
“Esse mapeamento é importantíssimo, a partir desses indicadores a gente consegue pensar juntos as demandas de cada região. Depois que identificamos esses desafios é possível pensar em soluções para a superação dessas demandas populares”, afirmou Gisele Castro, coordenadora do Golfinhos da Baixada que é uma iniciativa social de Queimados responsável pela agenda local do município.
Quando falamos de desigualdade, vale sempre lembrar que o Brasil tem a segunda pior concentração de renda do mundo, perdendo apenas para o Qatar. Sendo assim, o Mapa é uma ferramenta que ajuda a analisar como esse cenário se apresenta na Região Metropolitana do Rio. Para estabelecer esse diagnóstico completo, a publicação se dividiu em 10 eixos temáticos: habitação, emprego, transporte, segurança, saneamento, saúde, educação, cultura, assistência social e gestão pública.
Guilherme Braga, pesquisador do Mapa, contou que um dos maiores obstáculos durante a produção foi a falta de acesso à informações básicas nos sites das prefeituras e secretarias dos municípios, como por exemplo, o preço da passagem de ônibus.
“O primeiro grande desafio é reunir dados dos 22 municípios da região metropolitana mesmo em meio a falta de produção do estado. Depois é conseguir que as prefeituras respeitem os prazos estipulados pela Lei de Acesso à Informação (LAI) que assegura a transparência como norma. Ela já existe há 8 anos e dá direito a qualquer cidadão a acessar as informações que o estado tem no entanto, a maioria dos municípios não respeitam prazos e outros nem respondem. Para confirmar o preço das passagens nós tentamos ligar para algumas prefeituras mas alguns servidores não souberam nos responder o valor” contou Braga.
Além da coleta e organização dos dados, outro esforço do Mapa foi na hora de materializar essa pesquisa, a responsável pelo projeto visual do documento, Taynara Cabral, que também é assessora de comunicação da Casa, afirmou que a acessibilidade na hora da leitura foi a meta durante a criação do Mapa.
“O Mapa é uma publicação que não tem medo de usar as cores para narrar as histórias de cada eixo e facilitar essa leitura. A gente quis fazer com que essa publicação não fosse só academicista. Queríamos que ela fosse facilmente interpretada pelos mais diversos tipos de pessoas. Queremos que o Mapa seja usado em salas de aulas e também em rodas de conversas para que mais pessoas possam se apropriar dessas narrativas”, explicou Taynara.
Dados racializados marcam a nova edição do Mapa
A roda de conversa entre o coordenador executivo da Casa, Henrique Silveira e a Ana Carolina Lourenço, program officer na Fondo de Acción Urgente – América Latina e Caribe (FAU) e cofundadora do Movimento Mulheres Negras Decidem, encerrou o evento de lançamento do Mapa da Desigualdade 2020. Com o tema “Desigualdade estruturais, desafios emergenciais e o futuro das cidades”, os painelistas discutiram de que forma a partir do diagnóstico do Mapa, a região metropolitana poderia traçar um olhar para frente.
Silveira destacou como essa quarta edição do documento trouxe um olhar mais atento em relacionar às questões da desigualdade com o fator racial.
“Na Casa Fluminense a gente entende que não dá mais para falar de desigualdade sem localizar muito bem onde está o racismo, que é um instrumento que reforça e perpetua essas estruturas de desigualdade e violência na realidade do Rio metropolitano. Esse é um elemento muito forte que o Mapa traz ”, explicou Silveira.
Entre os dados mais violentos apresentando no mapa está o de percentual de homicídios de pessoas negras durante operações policiais e a diferença de idade média de morte entre brancos e negros. Em 20 das 22 cidades da região metropolitana, mais da metade dos mortos em operações policiais eram negros e em pelo menos 5 delas, essas pessoas representavam 100% dos mortos. Outro fato alarmante é que em todas os municípios, os negros morrem mais jovens que os brancos, seja por ações violentas ou não.
“Ao olhar para esses dados mais do que dizer que vivemos uma crise de segurança pública, de ética e de horizonte de mudança, bem como da falta de ação que marca as medidas de políticas públicas, esse cenário aponta para uma grande ação do estado programada na destruição da vida”, apontou Ana Carolina Lourenço.
O Mapa da Desigualdade tem esse objetivo, às vezes duro, de diagnosticar o cenário enfrentado pela população fluminense. Um próximo passo é a construção e participação no debate público eleitoral. Para isso, a Casa Fluminense vai construir uma nova edição da Agenda Rio 2030. Se o Mapa aponta os desafios, a Agenda chega posteriormente para trazer propostas de mudança e influenciar as decisões dos gestores públicos. Fiquem atentos.
Vale lembrar que o Mapa da Desigualdade é um documento gratuito então, se aproprie dessa narrativa: https://casafluminense.org.br/mapa-da-desigualdade/