O Fórum Rio 2022 ocupou o Museu de Arte do Rio na última sexta-feira (20/01) e as suas duas primeiras atividades foram a inauguração da exposição “Jamais Fomos Modernos”, com curadoria do Festival de Artes de Imbariê (FAIM), e o lançamento da nova edição da Agenda Rio 2030. Reunindo 48 propostas de políticas públicas voltadas para Região Metropolitana do Rio, a Agenda se dividiu para criar estratégias de incidência intersetoriais através de quatro justiças: racial, de gênero, econômica e climática.
Para fomentar esse debate e organizar ações coletivas de enfrentamento, o evento convidou especialistas, pesquisadores, lideranças sociais, jornalistas, representantes do poder público e alunos de prés comunitários para pensar esses caminhos.
Painel Justiça Racial, reparação e antirracismo: “Nós somos os sonhos dos escravos”
Com mediação da coordenadora de mobilização da Casa, Fabbi Silva, e as participações do diretor da Fundação Ford no Brasil Atila Roque; diretora executiva do PerifaConnection, Thuane Nascimento; e do coordenador geral do IPAD Seja Democracia, Cléber Ribeiro; a primeira mesa do Fórum Rio tratou das estratégias possíveis para a garantia de vida da população negra do estado do Rio de Janeiro. Segundo o Relatório de Monitoramento Agenda 2030, três em quatro mortes por letalidade violenta ocorreram na Região Metropolitana do Rio de Janeiro em 2020. Destas, 90% são homens e 71,1% são negros.
Em uma roda com números tao duros, o cientista político, Átila Roque, homem negro de 62 anos, emocionou a todos com sua fala. Em uma sala repleta de jovens negros que vieram ao Fórum em caravanas organizadas junto com prés-vestibulares comunitários, Roque convocou a todos a sonhar juntos.
“A justiça racial só será possível com uma reinvenção do Brasil. Não é por falta de dados ou propostas institucionais que nós não temos um bom plano de redução da letalidade policial. Nosso país está vivendo um processo de constituição do partido da violência, o partido da morte que organizou o ódio e violência a partir da base da sociedade, precisamos reconhecer isso. Nossa esperança está em fazer dessa luta o objetivo das nossas vidas. Somos nós, vivos, os sonhos dos escravos” contou, Roque.
No eixo de Justiça Racial, a Agenda Rio 2030 destaca como prioridade de governo as seguintes ações:
- A criação de um programa de redução de mortes violentas
- Revisão o Plano Estadual de Redução de Letalidade em decorrência de Intervenção Policia
- Implantar políticas e ações de reparação econômica, psicossocial e de direito à memória
- Garantir direitos e oportunidades para juventude negra em favelas e periferias
Painel Justiça de Gênero, equidade e cuidado: “Eu não sou uma boa escrava, na fuga tudo é válido”
Com mediação da coordenadora de comunicação da Casa, Larissa Amorim, e as participações da coordenadora geral da ONG CRIOLA, Lucia Xavier; da pesquisadora, Mariah Rafaela Silva; e da co-diretora do Instituto Alziras, Roberta Eugênio; o painel trouxe, em síntese, um alerta sobre uma espécie de políticas de desproteção que atingem mulheres, principalmente trans e negras. Esse ciclo vai desde a falta de Delegacias de Atendimento à Mulher (DEAMS) e redes de acolhimento territorializadas, mas também a outras violências silenciosas e diárias como a falta de creches, violência política contra parlamentares, sobrecarga de trabalho de cuidado não remunerado e baixa remuneração aos serviços prestados majoritariamente por mulheres.
“Nós movemos a cidade inteira o tempo inteiro e tem gente ganhando com isso. As mulheres negras transitam para prover serviço e para prover riquezas. Em algum momento tem que ser calculado o valor desse trabalho, por exemplo das empregadas domésticas. Do que estamos falando? Racismo patriarcal cishetero normativo”, resumiu Lúcia.
Na mesa, todas apontaram a seguridade social como um dos destaques principais do eixo de justiça de gênero. Essa é também uma das propostas presentes na Agenda Rio 2030 que busca propor ações de políticas públicas que não pensem em soluções para os desafios das mulheres em caixas separadas, entendendo os atravessamentos que marcam a vida das mulheres na metrópole fluminense. A diretora da ONG Criola, durante o Fórum Rio, chamou todas para a ação:
“É preciso tencionar, romper, reclamar e elaborar. A política não é coisa nova, já está aí estruturada e com capacidade de dar retorno porque do contrário me colocam de novo no lugar de escrava, e eu não sou uma boa escrava – principalmente porque para mim vale tudo pela fuga”, concluiu Lúcia Xavier.
No eixo de Justiça de Gênero, a Agenda Rio 2030 destaca como prioridade de governo as seguintes ações:
- Ampliar a rede de núcleos integrados e delegacias de atendimento à mulher
- Ampliar a cobertura dos Cras e Creas
- Criar e apoiar projetos e políticas públicas que promovam a autonomia financeira das mulheres cis e trans e para a população LGBTQIA+
- Criar Sistema Estadual de Cuidado, com conselho e plano
Nova Agenda Rio 2030
Chegando a sua quinta edição, a Agenda Rio 2030 vem tencionando cada vez mais o debate sobre desigualdades atrelado às lutas por justiça racial, de gênero, econômica e climática. Em um ano decisivo não só para o Rio mas também para todo o Brasil, a Casa Fluminense chega ao período eleitoral, e às vésperas das convenções ambientais, com uma agenda pensada a partir e para a periferia metropolitana fluminense.
Durante o lançamento, o coordenador geral da Casa, Henrique Silveira, comentou a reformulação da agenda que passou a olhar o Rio a partir de justiças não só por eixos setoriais.
“A gente acha que para superar essa desigualdade que tem hoje no Brasil inteiro a gente precisa falar de justiça. Vivemos em um país desigual não por falta de recurso humano, recurso natural, recurso financeiro – não é por isso. O Brasil é tão desigual porque falta justiça”, concluiu Henrique.
A Agenda Rio 2030 foi uma construção coletiva e sua aplicação se deu da mesma maneira, por isso, a Casa disponibilizou o material para download de forma gratuita. Use.