Cidades com piores indicadores de mobilidade não investem em planejamento

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Texto por
Saulo Pereira Guimarães
Data
26 de abril de 2017

Quando o assunto é trânsito, Belford Roxo, Japeri, Nova Iguaçu e Queimados apresentam os piores indicadores da região metropolitana do Rio (RMRJ). As quatro cidades têm os maiores percentuais de moradores que levam mais de uma hora de casa até o local de trabalho, segundo o Mapa da Desigualdade. Entretanto, os números ainda não chamaram a atenção das autoridades, já que nenhum desses municípios trabalha hoje em um plano de mobilidade urbana.

Estabelecido pela Lei 12.587, de 2012, o plano de mobilidade urbana (PMU) é um instrumento legal que se tornará obrigatório a partir de 2018 para cidades com mais de 20 mil habitantes, como é o caso dos municípios citados. As prefeituras que não tiverem um plano deixarão de receber verba federal de mobilidade até solucionarem a situação. A indicação de melhorias a serem implantadas, a distribuição de responsabilidades para efetivação das medidas e a definição de formas de financiamento estão entre as principais características do documento. “Sem planejamento, não há mobilidade eficiente para todos, o que se traduz em queda brutal na qualidade de vida das pessoas”, afirma Walter de Simoni, gerente de programa de mobilidade urbana do Instituto Clima e Sociedade. Na próxima quarta-feira  (03), o especialista participa de um hangout com Vitor Mihessen, coordenador de informação da Casa, pela nossa fanpage.

Vale dizer que a  falta de planejamento não é privilégio das localidades da Baixada Fluminense. Divulgado no último dia 18 pela Casa Fluminense, o Painel de Monitoramento dos Instrumentos de Gestão Municipal revela que nenhuma das 21 cidades do Rio Metropolitano tinha PMU até dezembro de 2016, de acordo com dados cedidos pelo Ministério das Cidades. “Cada município tem a responsabilidade de avançar com seu plano”, defendeu a diretora executiva do Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP) Clarisse Linke no Seminário de Planejamento e Cooperação Municipal na Metrópole do Rio. O evento aconteceu no último dia 12 na sede do Instituto de Arquitetos do Brasil, no Flamengo.

No caso de Belford Roxo, Japeri, Nova Iguaçu e Queimados, não há perspectivas de mudanças no horizonte próximo. Em Japeri, um representante da Câmara de Vereadores informou que nenhum projeto de PMU tramita hoje na casa. Nesse município, 54% dos moradores levam mais de uma hora para chegar ao trabalho, segundo o Mapa. Já as outras três prefeituras aguardam os desdobramentos do Promob, programa do Governo do Estado.

PROMOB

O Promob é uma iniciativa coordenada pela Câmara Metropolitana, órgão estadual dedicado a desenvolver a integração na região metropolitana do estado. O programa conta com orçamento de 1 milhão de dólares cedidos pelo Banco Mundial em 2015 para financiar a elaboração de planos de mobilidade urbana por consultorias privadas, escolhidas no começo do ano. No momento, a Câmara aguarda a liberação do dinheiro para firmar acordos com os municípios. “O prazo prevê a entrega dos planos 12 meses após a assinatura dos contratos pelos prefeitos”, informaram representantes do órgão.

Na 1ª fase do projeto, nove cidades serão contempladas. Na Baixada, Belford Roxo, Magé, Mesquita, Nilópolis, Nova Iguaçu, Queimados e São João do Meriti. No Leste Metropolitano, Itaboraí e São Gonçalo. De acordo com a Câmara, a escolha dos municípios levou em conta a proximidade entre eles e o tamanho de suas populações. Rio, Niterói e Caxias ficaram de fora por já terem contratado empresas para desenvolverem PMUs. “As demais cidades da região metropolitana serão contempladas na 2ª fase do projeto”, dizem representantes da Câmara.

Na opinião de Walter, a criação de planos municipais de mobilidade não será suficiente para que Belford Roxo, Japeri, Nova Iguaçu e Queimados diminuam o percentual de moradores que leva mais de uma hora para chegar ao trabalho. “É necessário um plano de mobilidade urbana metropolitana,  coordenando os diferentes municípios”, afirma ele. Com lançamento previsto para o segundo semestre de 2017, o Plano Estratégico de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI) é a resposta da Câmara à demanda do especialista. Quando estiver pronto, esse documento irá traçar diretrizes conjuntas para desenvolvimento dos 21 municípios da região até o ano de 2040.

VANTAGENS E DESAFIOS

A maior eficiência dos gastos públicos é uma das vantagens geradas pela elaboração de um bom plano de mobilidade urbana, de acordo com estudo elaborado pelo ITDP em parceria com a empresa pública alemã GIZ. Isso evitaria situações como a do corredor Transbrasil, onde a interrupção das obras entre agosto e abril de 2017 custou quase R$50 milhões aos cofres municipais, segundo dados da prefeitura do Rio. “Se a mobilidade é planejada da maneira certa, pode melhorar o acesso a oportunidades”, destaca ainda o documento citado. Isso é essencial na RMRJ, onde mais da metade dos moradores de municípios como Japeri, Belford Roxo e Nova Iguaçu trabalham fora da cidade onde moram, conforme revela o Mapa da Desigualdade.

Porém, a construção de um PMU envolve desafios que não devem ser desconsiderados. Um deles é a obtenção de dados precisos para a produção do documento, que ainda representa um grande empecilho para corpos técnicos nem sempre tão bem qualificados quanto deveriam. “Estamos falando de um sistema de fato complexo, que inclui pedestres, ciclistas, todos os modos de transporte público, carros e transporte de carga urbano, e que dialoga com questões de ocupação e uso do solo, planos de habitação, emissão de gases de efeito estufa e poluentes locais e por aí vai”, pontua Walter. Por conta disso, o Promob destinará 100 mil dólares  à capacitação de pessoal.

O gerente de programa de mobilidade do ICS destaca ainda como obstáculo o fato da União investir apenas em obras e não em planejamento. “Mesmo quando o governo federal ‘esbanjava’ dinheiro, o financiamento federal era exclusivamente para obras. Não existia nenhum recurso disponível para o desenvolvimento de planos de mobilidade, seja por consultores externos ou para a capacitação das prefeituras”, afirma ele. Outro ponto importante é a sintonia entre a proposta do plano e outras políticas públicas. No Brasil, a redução dos impostos para carros entre 2012 e 2015 por parte do Governo Federal contrariava o “foco no transporte não motorizado” definido pela Lei 12.587, por exemplo.

Painel de Monitoramento

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