Pandemia expõe falhas no financiamento e ampliam problemas do transporte no Brasil

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Comunicação Casa
Data
29 de abril de 2020

Um conjunto de 36 organizações da sociedade civil e movimentos sociais de todo o Brasil, que atuam na temática de mobilidade e direitos humanos, enviou, no dia 17/4 , uma carta a órgãos governamentais, municipalistas e empresariais com posicionamento unificado sobre a situação econômica e social dos transportes públicos e o Programa Emergencial do Transporte Social, que compõe emenda em discussão na Câmara dos Deputados. A iniciativa se deu diante da crise que a pandemia do novo coronavírus tem causado no setor. A Casa Fluminense é uma das organizações signatárias da carta propositiva.

“A campanha nacional que assinamos a partir da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, traz a necessidade de novos paradigmas para a mobilidade urbana nos centros e periferias, romper com práticas que não valorizem a vida de todas as pessoas e o meio ambiente. Reduzir o contágio do novo coronavírus nesse momento é evitar deslocamentos, principalmente aqueles feitos em aglomeração, como é regra no sistema de transporte das metrópoles brasileiras. Entretanto, para aqueles que dependem do transporte público é preciso garantir esse direito, de forma segura”, comenta Vitor Mihessen, coordenador de informação da Casa Fluminense.

No documento, as entidades frisam a obrigação de se garantir acesso ao serviço, que é essencial, e  procurar formas permanentes de financiamento do transporte, que não seja baseada somente na tarifa paga por passageiro, mas no custo de operação do sistema. Enfatizam ainda a necessidade de transparência em todos os dados relativos ao tema e de participação da sociedade nas decisões. Além disso, entendem que muitos dos problemas que as cidades vêm enfrentando para adequar a frota necessária a este momento, e a lotações e aglomerações resultantes disso são resultados dessa falta de recursos e transparência.

“Em países como Espanha, Itália e Argentina, onde já existe subsídio organizado ao transporte, foi possível conseguir auxílio financeiro durante a pandemia de forma mais ágil. Com isso, o debate pôde focar a higienização e organização do atendimento à situação excepcional. Já no Brasil o setor ficou sem fontes de recursos e com isso as prefeituras reduziram a oferta, mais do que o necessário pela quarentena, gerando as lotações que temos assistido ”, explica Rafael Calabria, especialista em mobilidade do Idec.

Pandemia acentua problemas históricos do transporte público brasileiro

Terminal Rodoviário João Goulart, terminal de transportes urbanos municipais e intermunicipais localizado no Centro de Niterói. Foto: Léo Lima

A redução de usuários nos transportes, resultado das necessárias medidas de isolamento social, gerou queda de arrecadação no setor, revelando falhas históricas dos sistemas de transporte no Brasil. Entre elas, está a falta de fontes variadas para financiar o transporte – sendo seu custeio baseado integralmente no pagamento da tarifa pelo usuário, em grande maioria das cidades – e a remuneração das empresas concessionárias baseada no número de passageiros e não no custo de operação do sistema em si.

“Isso resulta em aumentos tarifários recorrentes, muitas vezes acima da inflação, e com lotações excessivas dos veículos para tornar o setor lucrativo. Por isso, temos redes de transportes caras, de baixa qualidade e excludentes, com perda contínua de passageiros, alimentando o círculo vicioso”, afirma Cleo Manhaes, assessora política do Inesc.

Já o fato das empresas de ônibus serem remuneradas com base no número de passageiros transportado incentiva a lotação dos veículos, deixando em segundo plano a qualidade do sistema. “Se um ônibus carrega uma ou 50 pessoas, isso não altera o gasto na operação, como combustível, manutenção, recursos humanos etc. Por isso o cálculo não deve ser feito por usuário, mas  pelo custo para se colocar aquele veículo na rua”, argumenta Letícia Birchal, integrante do Tarifa Zero BH ressaltando que esse padrão é criticado há anos por especialistas e entidades que assinam o posicionamento.

No entanto, só agora, diante da queda no número de usuários pagando a tarifa, e consequentemente de sua receita, as empresas do setor vieram a público pedir ao governo federal a remuneração por custo. Isso evidenciou que essa é a melhor opção para os sistemas funcionarem sem lotação excessiva, garantindo qualidade e atestando que o custo do sistema independe da quantidade de passageiros transportados.

“Há diversas outras fontes de receitas para garantir o transporte como um direito social básico, assim como trata a constituição federal brasileira desde 2015. Nesse sentido, simplesmente bancar as empresas concessionárias nesse momento não é socialmente justo, nem economicamente viável, nem ambientalmente responsável. A pandemia precisa deixar de ser uma ameaça para a população e passar a ser uma oportunidade de revisar lógicas perversas e garantir um desenvolvimento sustentável”, completa Vitor Mihessen, da Casa Fluminense.

Além disso, as entidades colocam a necessidade de enfrentar o problema histórico de  falta de transparência e controle público de custos nos transportes, resultantes de contratos fracos, baixa capacidade de fiscalização e elevada influência das empresas do setor nas decisões públicas.

Entenda os posicionamentos da sociedade civil sobre “Programa Emergencial Transporte Social”

Diante dos impactos da pandemia, secretários e empresários do setor de transportes, em carta publicada e formalizada na Emenda 26 à Medida Provisória 936/2020, apresentaram o “Programa Emergencial Transporte Social”. Entre os principais pontos comentados na carta estão:

Conheça todas as propostas de medidas emergenciais aqui

O posicionamento foi assinado pelas seguintes entidades:
Ameciclo – Associação Metropolitana de Ciclistas do Recife
Andar à Pé – DF
Bigu Comunicativismo
BrCidades
Casa Fluminense
Centro Popular de Direitos Humanos
Cidadeapé – Associação Pela Mobilidade a Pé em São Paulo
Fórum Paraibano da Pessoa com Deficiência
Idec – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor
Inesc – Instituto de Estudos Socioeconômicos
Instituto Aromeiazero
Instituto de Arquitetos do Brasil – Departamento Distrito Federal – IAB/DF Instituto de Arquitetos do Brasil – Departamento Rio Grande do Sul – IAB/RS Instituto de Arquitetos do Brasil – Departamento São Paulo – IAB/SP
Instituto de Cidadania Empresarial do Maranhão- ICE-MA
Instituto Ilhabela Sustentável
Instituto Maranhão Sustentável
Instituto Nossa Ilhéus
Instituto de Pesquisa em Direito e Tecnologia do Recife- IP.rec
Instituto Urbe Urge
ITDP – Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento
Minha Campinas
Movimento Nossa Brasília
Movimento Nossa BH
Movimento Passe Livre – Distrito Federal e entorno
Movimento Passe Livre – Niterói
Movimento Passe Livre – São Paulo
Observatório do Recife
Observatório das Metrópoles – Núcleo UEM/Maringá
Programa Cidades Sustentáveis
Renfa-PE – Rede Nacional de Feministas Antiproibicionistas em Pernambuco
Rodas da Paz
Rede Nossa São Paulo
Soma Brasil
Tarifa Zero BH
UCB – União de Ciclistas do Brasil

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