O Fórum Rio ocupou na última semana de forma inédita um museu, que foi palco também da primeira exposição feita pela Casa Fluminense com curadoria de Osmar Paulino e concepção do Festival de Artes de Imbariê (FAIM). Essa também foi a primeira vez de três dos cinco artistas que foram convidados para expor na “Jamais Fomos Modernos”, que ficou aberta nos dois dias do Fórum no Museu de Arte do Rio (MAR). Conheça um pouco sobre cada um dos artistas que participaram dessa junção de estreias.
Vika Teixeira | @c0rpa
A estudante de produção cultural da UFF, de 23 anos, é cria do Morro do Inferninho, localizado na região oceânica de Niterói. Enquanto uma travesti preta e periférica, Vika busca que a violência esteja contextualizada na sua arte, mas essa não seja a única evidência sobre a vida das travestis.
“Quis trabalhar com a realidade e o que consigo criar a partir dela. Acredito muito na potencialidade da imaginação radical, pego a realidade que me é dada e construo outras possibilidades de existência, de narrativas e de confabulação. Trazer esses dados para outro lugar, não da violência”
A artista começou no meio da costura, ela queria e precisava de roupas para dar vida a quem é. A partir desses primeiros pontos, Vika passa a investigar e pesquisar mais sobre gênero, corpo e identidade. A busca é por dialogar e tensionar para que haja um processo de reflexão, segundo ela, essa é uma forma de não morrer engasgada.
Mayra Karvalho | @ma.y.ra__
Nascida em Belford Roxo, Mayra Karvalho, de 25 anos, busca retratar em seus trabalhos as questões raciais e cosmovisões sobre saberes ancestrais. A artista afirmou que se manter a partir do seu trabalho não é uma tarefa fácil, mas que a exposição foi um momento de respiro e animação.
“Ver meu trabalho ali e estar sendo uma das representantes do meu território e da minha raça são coisas incríveis. Isso me faz pensar que estou caminhando por onde queria, num lugar que me faz revisitar a memória da pessoa que eu queria ser como artista. Esse momento da exposição, pra mim, ecoa como uma confirmação de que estou conseguindo transmitir saberes e minhas visões de mundo.
As duas peças escolhidas pela artista falam sobre o futuro enquanto tratam do presente e do passado. A base para isso é encarar o saber ancestral como guia para um futuro diferente. Uma de suas inspirações é o ativista da causa quilombola, Nêgo Bispo, e o seu entendimento contracolonial de que o presente é o interlocutor do passado e o locutor do futuro.
“Os saberes são repassados pelos nossos anciões enquanto também habitam o existir de nossas crianças. O conhecimento está sendo colocado para além da nossa própria fala”, concluiu Mayra.
13unituh | @13unith
André Luiz Macedo de Moura é cria de realengo e começou a desenhar ainda criança. Hoje, aos 30 anos, o artista se sente satisfeito com espaço de expor em museus espaços, que quando criança se sentia deslocado nas raras vezes em que esteve. A primeira vez que entrou em um museu por vontade própria foi para acompanhar a batalha do conhecimento, conduzida pelo MC Marechal, que acontecia no MAR. Ele destacou essa coincidência.
“O MAR é o primeiro museu que entrei por vontade própria, também o primeiro que vi jovens negros e periféricos receberem posição de destaque promovendo cultura. Estar no MAR tem essa nostalgia, esse contexto, e apesar dos meus trabalhos que estão expostos lá serem reproduções que reduzem em tamanho e magnitude a obra, a minha presença neste espaço fala mais alto”
13unituh aborda em suas obras o que chama de distância comportamental entre o projeto de colônia, vista no Rio na zona sul, e o povo colonizado, marginalizados em sua maioria. Com isso, o artista quer reafirmar que comportamento dos periféricos que não cabem nos modelos eurocêntricos do Brasil. André chama esse fenômeno de 13urla, que significa: “le-se Burla”.
Bea Simões | @atrixbea
Formada em Ciências Sociais pela UFRJ e de teatro pela E.T.E. Teatro Martins Penna, Bea Simões iniciou no mundo das artes por uma necessidade de expressar sua insatisfação com as violências cotidianas sofridas principalmente pelas mulheres, escancarando os pontos que afetam diretamente toda população do seu território. Cria de São João de Meriti, aos 24 anos, Bea já expôs em outros espaços culturais como o Museu da República, no Catete, e no Museu de Arte Contemporânea de Niterói.
“Nas minhas obras busco promover a representação negra feminina, usando a pintura como maneira de manifestação contra formas de racismo, até representações de problemáticas sociais, políticas e econômicas que fazem parte do meu território, de toda baixada fluminense e de todo o Rio. Sendo assim, expô-las não está ligado a perpetuação destas, tampouco de dizer que só há problemas e coisas ruins onde eu vivo, mas sim, como forma de manifestar que o que vejo, não é bom”, explicou a artista.
Bea contou também que as duas obras que fizeram parte da “Jamais Fomos Modernos” são suas favoritas. Ver seu trabalho no MAR era um sonho antigo que já cultivava mas não acreditava que o realizaria tão cedo. A artista frisou sua felicidade em ver suas telas ao lado de outros artistas também de periferias e da Baixada.
Jônatas Moreira | @jonatxs.art
Jônatas Moreira, de 23 anos, é morador do Amapá, um bairro do quarto distrito de Duque de Caxias. O artista começou a produzir aos 17 anos, em um processo de autoconhecimento e também reflexão sobre o território que nasceu, a inspiração das obras vieram de lá.
“Essas obras trazem objetos e plantas que fazem parte do ambiente que eu vejo no meu cotidiano aqui na minha periferia. Meu distrito está na borda da cidade, e são em lugares como esse que vejo muito descarte sendo feito de forma inapropriada, principalmente eletrônicos antigos. Meu território está 200% nas minhas obras”
Nas suas obras, Jônatas busca fazer uma denuncia ambiental desses descartes. Os quadros escolhidos para exposição fazem parte de uma série que questiona a velocidade com que as tecnologias hoje giram, como a indústria hiper produz certos produtos e daqui há seis meses tem um novo produto mais novo, leve e inovador.