Além das parcerias público-privadas (PPPs) para 11 municípios da Região Metropolitana do Rio (RMRJ), o Governo do Estado propõe mais caminhos para expandir o sistema de coleta e tratamento de esgoto nos demais municípios fluminenses onde a Cedae atua. A sociedade civil, por sua vez, defende outros rumos.
O estudo que desenhou a modelagem de PPP (leia aqui) avaliou um total de 22 municípios das Bacias Hidrográficas da Baía de Guanabara e do Guandu. Porém, de acordo com a Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico, Energia, Indústria e Serviço (Sedeis), foi possível incluir na proposta apenas as 11 cidades mais adensadas, divididas em três lotes.
Ficaram de fora Cachoeiras de Macacu, Eng. Paulo de Frontin, Itaboraí, Mangaratiba, Maricá, Miguel Pereira, Paracambi, Piraí, Rio Bonito, Rio Claro e Tanguá. Não ter adensamento populacional significa fazer investimentos acima do retorno mínimo possibilitado pela cobrança de tarifa. Aos olhos da iniciativa privada, são áreas que não oferecem atratividade.
Já o adensamento atrai a ponto de a Sedeis ter expectativas de encontrar uma modelagem de concessão também para as comunidades pacificadas. Este é outro projeto em estudo, abrangendo 500 mil pessoas de 24 favelas mais o complexo da Maré.
Além desses dois projetos, a subsecretária estadual de Parcerias Público-Privadas, Paula Martins, fala em outros dois caminhos. “A projeção de caixa da Cedae aumenta muito [se as PPPs forem adiante], vai sobrar recursos para ela investir em áreas onde não haja atratividade para o setor privado. Além disso, nosso governador mandou aquele ofício para o BNDES incluindo o estado no programa de PPI (Programa de Parcerias de Investimentos, do Governo Federal). A gente quer tratar com o BNDES os outros municípios onde a Cedae atua. Sobra recurso para investir em áreas não rentáveis”, frisa ela.
A Cedae está presente em 64 municípios. Embora o balanço da empresa indique boa saúde financeira, a companhia, segundo Paula, deu todos os seus recebíveis futuros em garantia para captar os R$ 3,4 bilhões da Caixa, que estão sendo aplicados no sistema Novo Guandu, de melhoria no abastecimento de água da RMRJ.
“É uma garantia até desproporcional ao volume do financiamento que ela pegou, não foi feita uma escala para ir liberando recursos aos poucos. A gente vem negociando com a Caixa para ter liberação de recursos”, informa Paula. Conseguindo isso, a companhia estará apta a captar mais financiamento. A estratégia da Sedeis é fortalecer a Cedae e não privatizá-la, mas fica em aberto se, no âmbito das PPIs, serão feitas outras concessões à iniciativa privada.
Garantia de acesso aos mais pobres
Setores da sociedade civil defendem alternativas diferentes para a Cedae. Sergio Ricardo Lima, fundador do Movimento Baía Viva, por exemplo, propõe a criação de consórcios públicos, entre as prefeituras e a Cedae. O deputado estadual e ex-vice-governador Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB) apoia a captação de mais financiamento para a companhia poder expandir também a rede de esgoto.
“Se na hora que o Estado mostra não ter capacidade de gestão financeira, na casa dos bilhões, como vender a única empresa que ele tem claramente lucrativa?”, questiona o deputado, que é líder da bancada do PSDB na Assembleia Legislativa (Alerj). Ele defende a Cedae pública, mas com metas físicas e financeiras sendo reguladas pela Agenersa.
Outro questionamento é a necessidade de manter os subsídios cruzados, de forma a garantir o acesso ao sistema pelos mais pobres. “Um sistema de abastecimento de água e coleta de esgoto, por exemplo em Itaperuna [norte fluminense], não tem iniciativa privada que vá querer, porque se você somar os investimentos, os gastos operacionais e a manutenção, não tem retorno de capital. Então você precisa de subsídio cruzado. Cadê estudos sobre subsídio cruzado feitos pelos BNDES da vida? Nenhum. Para ter um outorga de R$ 1 bilhão [valor estimado com a venda da estatal], você vai quebrar outros subsistemas?”, declara ele, ao questionar a ideia de privatizar a companhia.
O também deputado estadual Paulo Ramos (Psol), por sua vez, é autor de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que manteria a Cedae pública, com 99% de seu controle acionário nas mãos do Governo do Estado. Sergio Ricardo é um dos grandes defensores da ideia. “Se a Cedae for privatizada, 2 milhões de pessoas serão prejudicadas. São as pessoas mais pobres que têm acesso à água de graça ou com tarifa social. É o subsídio cruzado que permite à população da Baixada, de São Gonçalo, das periferias e favelas ter acesso à água, que é um direito humano”, alerta.
Como alternativa, o ambientalista sugere a criação de consórcios públicos entre governos municipais e a Cedae. Ele acha viável um consórcio por bacia hidrográfica, com figura jurídica própria, responsável por captar recursos e assumir plano de metas. “Há várias instituições defendendo o consórcio. Iniciamos uma conversa sobre isso em setembro na reunião do Baía Viva, com sindicatos de trabalhadores da Cedae, a Associação dos Engenheiros da Cedae, a Sociedade dos Engenheiros e Arquitetos do Estado do Rio (Seaerj), entre outros. Por exemplo, poderia juntar Belford Roxo, Nova Iguaçu e Duque de Caxias para cuidar da bacia do Rio Botas”, exemplifica ele.
Um próximo passo fundamental será debater o tema, reunindo os novos prefeitos que tomarão posse em primeiro de janeiro. Evento com esse objetivo tem sido defendido por grupos e instituições, entre elas o recém-criado Grupo de Trabalho (GT) sobre Saneamento, do Conselho Estadual de Recursos Hídricos (Cerhi). A ideia conta com apoio da Casa Fluminense.
Leia também:
Cedae em debate: “Se a gente sair de uma caixa preta para outra não muda nada”