Em uma iniciativa marcada pela empatia e acolhimento, o Espaço Gaia, localizado no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, desempenha um papel muito importante na vida de dezenas de famílias do território há dois anos. O projeto surgiu a partir das demandas de saúde e infraestrutura para as famílias, principalmente as mulheres gestantes, que residem no território conhecido como o antigo Lixão de Itaoca.
A diretora de mobilização do coletivo, Maiara Aparecida, compartilhou sobre as ações de acolhimento e políticas públicas que o Gaia realiza na região. Maiara, também é moradora do complexo e já foi uma das acolhidas pelo projeto. Na entrevista, ela compartilhou sobre o surgimento da iniciativa e as atividades que se dão principalmente a partir das rodas de conversa realizadas no antigo Lixão, promovendo discussões a fim de empoderar as mulheres gestantes do território.
Durante os 2 anos de atuação do Espaço Gaia dentro do Lixão, além dos problemas socioeconômicos e de infraestrutura, a equipe presenciou as famílias enfrentando diversas dificuldades territoriais. Segundo Maiara, as rodas eram realizadas nos fundos do antigo Lixão de Itaoca, e desde o início a equipe foi impactada pela realidade de injustiças socioeconômicas e climáticas que os moradores enfrentavam.
Os desafios e a coleta de dados
Considerando as condições enfrentadas pelas mulheres e suas famílias, principalmente em relação à infraestrutura precária, a equipe do Espaço Gaia decidiu criar o Observatório de Olho em Itaoca, com o intuito de monitorar o local, produzir dados e construir políticas públicas alinhadas com as demandas dos moradores.
A observação e acompanhamento das questões econômicas, raciais, climáticas e gênero que atravessam o território reverberaram na produção do “Relatório de Monitoramento”, que buscou detalhar e entender as necessidades dos moradores do Salgueiro. A produção do Relatório foi uma das ações desenvolvidas pelo Espaço Gaia em 2023 a partir do apoio da Casa Fluminense através do Edital Agenda Rio 2030: Enfrentamento ao Racismo Ambiental, Geração Cidadã de Dados e Incidência Política.
Segundo Maiara, para o processo de coleta de dados eles iam todos os sábados entrevistar as famílias para entender a realidade socioeconômica da região. Para ela, os dados mais alarmantes foram o número de pessoas que não tem banheiro em casa e que dependem de uma mangueira clandestina para ter acesso à água. “É surreal a pessoa não ter vaso sanitário em casa”, compartilhou.
A diretora de mobilização do Espaço Gaia, contou ainda como foi para ela acompanhar a coleta de dados: “Foi muito impactante, descobri coisas dos moradores que eu não sabia. Você vê no dia a dia, mas você não sabe mais a fundo, e descobre que a pessoa não sabe ler, não tem banheiro em casa, não tem fogão. Foi impactante saber isso das pessoas que eu conheço desde pequena”.
Acolhimento coletivo
As atividades se propõem a ser um espaço de construção de acolhimento coletivo, que vai desde rodas de conversa, entrega de cestas básicas e kits de higiene pessoal, até ensaios fotográficos e chás de bebê coletivos. O projeto, que começou com seis famílias, agora atende mais de 50, e continua com perspectiva de crescimento. Maiara compartilhou um pouco das atividades realizadas pela equipe e enfatizou que o objetivo não é apenas fornecer alimentação e produtos de higiene pessoal, mas também promover informação, acolhimento e suporte emocional.
“Fazemos rodas de gestantes para falar sobre violência obstétrica, sobre saúde e no final fazemos um ensaio fotográfico com elas aqui na Praia da Luz. Também realizamos o chá de bebê coletivo, entregamos kit de fraldas. Além de outras atividades como levar no teatro, já levamos no Maracanã também, que foi uma experiência incrível para as crianças”, compartilhou Maiara sobre as atividades realizadas pelo Espaço Gaia com as famílias.
Acreditar no acolhimento como um dos caminhos para combater as desigualdades de gênero, racial, econômica e climática, é uma forma sensível e potente de atender as demandas dessas pessoas de forma interseccional. Elas precisam ser ouvidas, e as políticas públicas para promover maior equidade em território como o Complexo do Salgueiro precisam partir do diálogo e da escuta dos moradores.
Essa escuta é o que a equipe do Espaço Gaia se propõe a fazer pelo território do antigo Lixão de Itaoca, e o impacto disso reflete na confiança que os moradores depositam no projeto. “As pessoas que confiam e acreditam na gente. Se o nosso trabalho não fosse impactante estaríamos vazios, mas a casa está cheia”, reiterou Maiara.
O futuro do Salgueiro
Para o futuro, Maiara vislumbra um Complexo do Salgueiro mais reconhecido e assistido. Ela destaca a importância de olhar além da violência e enxergar as pessoas que vivem lá. A água, a luz e o saneamento básico são desafios diários, a serem enfrentados pelos moradores, e precisam do apoio do poder público para conseguir driblar esses problemas. O projeto vai continuar trabalhando e adotando uma abordagem para mitigar os impactos socioeconômicos que o território vem sofrendo.
O lançamento do Relatório, após meses de pesquisa e esforço, foi um passo marcante. Maiara expressou seu entusiasmo por continuar essa jornada, consciente de que cada passo dado é uma contribuição valiosa para a transformação no Complexo do Salgueiro. O Espaço Gaia é mais do que um projeto, é uma fonte de esperança e mudança para uma comunidade que merece ser ouvida e apoiada.
A Casa Fluminense acredita em um futuro mais justo e igualitário, e é fundamental unir forças com organizações como o Gaia para que esse caminho seja projetado de forma coletiva. Potencializando a incidência política que a sociedade civil e as organizações podem ter a favor de uma metrópole mais justa.