“Qual é a agenda?” discute pobreza em Jardim Gramacho

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Texto por
Comunicação Casa
Data
11 de junho de 2013

No primeiro encontro da “Agenda Rio 2017”, cujo objetivo é promover s reflexão e construção compartilhada da agenda de políticas públicas para o estado do Rio de Janeiro para além de 2016, a Casa Fluminense realizou, em parceria com o Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (IETS) e o Fórum Comunitário de Jardim Gramacho, um encontro em torno do tema de superação da pobreza. Estudantes, pesquisadores e lideranças locais reuniram-se no bairro do município de Duque de Caxias onde, por 35 anos, funcionou o maior depósito de resíduos sólidos da América Latina.

Para estimular o debate Valéria Pero, professora do Instituto de Economia da UFRJ e pesquisadora associada do IETS, e a economista Maria Guerreiro apresentaram um estudo sobre a realidade da pobreza no Brasil e no estado do Rio de Janeiro. Uma avaliação das políticas para superação da pobreza também esteve na agenda de discussão.

A apresentação, desenvolvida pelo IETS com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), do IBGE, apontou que o percentual de pobres – pessoas com renda média per capita abaixo de R$ 220 – no estado do Rio é de 16%. O número é o maior de toda a região Sul e Sudeste. Segundo Valéria Pero, o índice elevado é resultado do ritmo de crescimento da renda por domicílio mais lento que em outros estados combinado com uma lenta diminuição da desigualdade.

– O  crescimento da renda no Rio é menor que o da média brasileira; a diminuição da desigualdade também é menor que o da média nacional. Tem-se uma porcentagem de pessoas vivendo no estado de pobreza maior do que o esperado.

A constatação reafirma a especificidade do Rio com um modelo de crescimento alavancado por setores que têm base em grandes empresas, sugere Valéria. Segundo ela, é nos setores de óleo e gás, tradicionalmente inseridos na realidade do estado, que se observam os melhores salários do país, no entanto, concentrados em uma minoria.

– O Rio tem esse modelo baseado em grandes setores, poucas empresas. Elas são intensivas em capital e utilizam mão-de-obra muito qualificada. Por outro lado, são setores que não geram desenvolvimento local utilizando fornecedores locais e, assim, adensando a cadeia produtiva, com mais empresas trabalhando e mobilizando maior efetivo – ponderou a professora, que defende a ampliação de políticas públicas de geração de emprego e renda como uma estratégia para superar a pobreza.

– O investimento sério na população de baixa renda vai gerar um ganho de produtividade maior que o feito sobre o efetivo com nível superior. Isso vai ajudar a diminuir as diferenças de renda entre todos os níveis de escolaridade.

Outro dado do estudo apontou uma grande diferença, em relação à pobreza, entre os municípios do Rio. Segundo Maria Guerreiro, a disparidade é tão significativa que entre a capital e o município de Japeri, por exemplo, a diferença é de aproximadamente 25%. Em Japeri, o percentual de pobres é de mais de 45% da população – quase a metade da cidade.

Para Valéria, são dois os fatores que influenciam nesse resultado: o desemprego e a renda. Para alterá-lo, é preciso ampliar o acesso a programas de formação e qualificação profissional, bem como de incentivo ao empreendedorismo, alternativas que possibilitem um aumento de produtividade ou de capacidade de entrada no mercado de trabalho: “É uma chance maior de gerar ocupação, de gerar uma renda melhor para essa população”.

Iniciativas essas que deveriam estar na agenda de prioridades do poder público, apontou José Marcelo Zacchi. Para o diretor executivo da Casa Fluminense, não se trata de um “reducionismo” relacionar à vontade política essa responsabilidade: “Tem de ser uma decisão muito clara, isto é, ser o objetivo fundamental dessa sociedade, desse poder público, reverter o quadro. Cada ato, cada investimento será pautado na pergunta: em que isso ajuda a reduzir a desigualdade?”.

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A situação em Jardim Gramacho

Um exemplo de oportunidade desperdiçada foi dado pela coordenadora do Centro de Referência de Assistência Social de Jardim Gramacho, Andréia Torres, que contou que, durante o processo de encerramento das atividades no aterro, foram planejados cursos profissionalizantes para os ex-catadores. A iniciativa não seguiu adiante em virtude do baixo grau de escolaridade dos trabalhadores. Segundo dados do IETS, a escolaridade média dos adultos no bairro é de 6,2 anos de estudo, o que corresponderia ao Ensino Fundamental incompleto. Entre catadores, a média é ainda menor, está em torno de 4 anos de estudo; a incidência de analfabetismo funcional é de 40%. Assim, as vagas oferecidas pelo Programa Nacional de acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), do Governo Federal, não puderam ser preenchidas, já que elas exigiam segundo grau. Foram oferecidos alguns cursos de nível fundamental, mas estes, segundo Andréia, não foram bem recebidos.

– Houve ofertas, mas não eram compatíveis com a realidade local. Essa não é a solução, não adianta pegar um pacote aleatório de cursos e oferecer, porque não vai resolver o problema – ponderou José Marcelo, que ainda chamou atenção para a prática culturalmente estabelecida em Jardim Gramacho da coleta e reciclagem de resíduo sólido. – É uma indústria crescente em qualquer lugar e se houver uma atitude generosa de geração de trabalho, empreendedorismo e formação, isso será valorizado tanto pela dimensão de atividade econômica quanto de ganho social. Mas a atitude clássica é a dificuldade de convencer a indústria a incorporar catadores. Do ponto de vista frio da eficiência, talvez faça sentido, mas se houver uma preocupação de gerar ações de trabalho e renda, a decisão terá que ser outra.

Segundo Maria Rosinete dos Santos, ex-dirigente de cooperativa de catadores de material reciclável e atual responsável pelo grupo de trabalho (GT) Geração de Trabalho e Renda do Fórum Comunitário de Jardim Gramacho, criado em 2005 para representar o bairro, quando o aterro foi fechado, em junho de 2012, foi exigida a  formalização das cooperativas que trabalhavam recolhendo itens reutilizáveis do lixo. A intenção era criar formas de sustento para os catadores após o encerramento das atividades do aterro sanitário. No entanto, segundo Maria Rosinete, o poder público não cumpriu a sua parte no acerto.

– A gente fez a nossa parte e o poder público não deu continuidade à formalização que eles exigiram. Não houve a implantação da política de coleta seletiva em Duque de Caxias. Cadê o Centro de Desenvolvimento Local que deveria ter sido colocado aqui antes do encerramento do aterro? – questionou.

Segundo Maria Rosinete, antes do encerramento do aterro, o catador, mesmo na informalidade, conseguia uma renda mensal de até 5 mil reais: “Eu costumo dizer que de coitadinho ele não tinha nada”. O que faltou ao operário do material reciclável na iminência do fechamento do aterro, explicou, foi a implantação do Centro de Desenvolvimento Local que não aconteceu: “faltaram cursos, empregos, legalização da informalidade, iniciativas que evitariam o grande impacto social que ocorreu”.

Para conferir na íntegra, veja o vídeo aqui.

Para ter acesso à síntese das apresentações  das palestrantes, clique aqui.

A apresentação eletrônica das palestrantes pode ser consultada aqui.

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